WWF-Brasil alerta: Pequenas Centrais Hidrelétricas no Pantanal podem gerar prejuízo de R$ 7 bilhões

WWF-Brasil alerta: Pequenas Centrais Hidrelétricas no Pantanal podem gerar prejuízo de R$ 7 bilhões

Estudo inédito aponta que o Brasil pode apostar em um prejuízo bilionário no Leilão A5 que será realizado hoje, 22 de agosto

A construção de 59 empreendimentos de energia hidráulica, a maioria Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), na Bacia do Alto Paraguai (BAP), que abrange o Pantanal e áreas de planalto, trará um prejuízo de pelo menos R$ 7,04 bilhões para a sociedade brasileira como um todo e uma série de impactos econômicos e socioambientais, revela estudo inédito encomendado pelo WWF-Brasil. 

Esta análise está amparada por dados da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e com base na metodologia oficial de Análise de Custo-Benefício (ACB) do governo federal, comparando o cenário das PCHs a uma alternativa de mix de energias renováveis não-hídricas (50% eólica, 42% solar, 4% biomassa e 4% biogás). A conclusão é clara: o mix renovável não apenas garante a mesma potência firme (409,55 MW) como também gera retorno líquido positivo de R$ 4,84 bilhões, frente à perda de R$ 2,20 bilhões com as PCHs — diferença suficiente para instalar o dobro da capacidade do mix renovável e ainda economizar R$ 531,88 milhões, evitando um prejuízo total de aproximadamente R$ 7 bilhões.

Os prejuízos podem ser ainda maiores quando levado em conta as alterações previstas na vazão dos rios devido à mudança climática, algo ignorado nos projetos. Por outro lado, a escolha por outras fontes renováveis (eólica, solar, biomassa e biogás) se mostram mais resilientes e mais vantajosas do ponto de vista econômico.

O WWF-Brasil recomenda que o Leilão A5 priorize fontes renováveis de baixo impacto, excluindo as PCHs previstas para a Bacia do Alto Paraguai, e que os subsídios sejam redirecionados para tecnologias sustentáveis e resilientes. “Investir em PCHs no Pantanal não é apenas ambientalmente arriscado, é sobretudo uma decisão economicamente ineficiente. Estamos falando de um modelo que gera prejuízo bilionário, destrói cadeias produtivas consolidadas – como a pesca e turismo – e transfere renda pública para um setor concentrador de benefícios. Em pleno ano da COP30, o Brasil precisa mostrar liderança ao escolher alternativas de geração de energia mais baratas, resilientes e seguras, como a solar e a eólica, que podem entregar a mesma potência firme sem impor esse custo desproporcional à sociedade”, afirma Alexandre Gross, especialista de Conservação e líder de Infraestrutura e Transição Energética do WWF-Brasil.

Cenários comparados: PCHs x mix de energias renováveis não-hídricas

O chamado “cenário de projeto” considera a construção de 59 PCHs com potência instalada total de 744,63 MW, potência firme de 409,55 MW e a necessidade de 2.445 km de linhas de transmissão. Já o chamado “cenário base” propõe gerar a mesma potência firme a partir de um mix de renováveis não-hídricas composta por 50% de energia eólica, 42% solar, 4% biomassa de bagaço de cana e 4% biogás. Esse mix exigiria 316 km de linhas de transmissão.

Também considera que ambas as opções resultarão em um mesmo incremento na oferta de energia, gerando um mesmo benefício social de aproximadamente R$ 11,35 bilhões.

A análise incorporou também os efeitos das mudanças climáticas sobre a geração hidrelétrica. Dados da ANA indicam que a vazão dos rios da BAP deve cair cerca de 16% até 2055. Como as PCHs dependem diretamente dessas vazões e não contam com reservatórios de acumulação, sua produção energética será comprometida.

Simulações com 9.999 cenários climáticos indicam que, com a queda nas vazões, o prejuízo para a sociedade pode subir para R$ 7,61 bilhões, uma perda adicional de 25%. Em contraste, o mix de renováveis não-hídricas é mais resiliente, pois combina fontes com sazonalidades complementares: ventos mais fortes no período seco e maior radiação solar no período chuvoso.
 

Prejuízos socioeconômicos: impacto direto na vida das pessoas

A maior parte dos prejuízos socioeconômicos das PCHs está relacionada à pesca, atividade central para a economia e a cultura da região. Esses empreendimentos comprometem populações de peixes migratórios e fragmentam seus habitats, impactando diretamente 1,4 milhão de pessoas na BAP — entre elas, 617 mil que consideram a pesca atividade de alta importância. A partir de estudos conduzidos pela ANA estima-se uma perda anual de R$ 502,6 milhões apenas na pesca difusa. Somados os efeitos em cadeia sobre a economia local e a degradação de serviços ecossistêmicos, o prejuízo total ultrapassa R$ 6,3 bilhões.

Os pescadores profissionais e suas famílias também são severamente afetados, com prejuízos diretos e indiretos ao longo de 30 anos que ultrapassam R$ 838 milhões em valor presente, além da ameaça à continuidade de modos de vida tradicionais.

A construção das PCHs também afeta, entre outras áreas:

  • a pesca profissional artesanal, com perda anual de R$ 53,7 milhões em renda direta;
  • o turismo de pesca, com prejuízo anual de R$ 54,55 milhões em gastos diretos e R$ 12,27 milhões em cadeia produtiva.
  • a qualidade nutricional da população, com perda de R$ 29,29 milhões por menor consumo de pescado.
  • o modo de vida tradicional, estimado em R$ 8,29 milhões anuais de perdas.

O estudo conclui que a instalação de novas PCHs na Bacia do Alto Paraguai representa uma decisão econômica irracional, ambientalmente arriscada e socialmente injusta. A perda de biodiversidade, a desestruturação de cadeias produtivas e a ameaça ao modo de vida de milhares de pessoas tornam os projetos inviáveis mesmo sob a ótica financeira.

Silvia Zanatta, especialista de Conservação do WWF-Brasil afirma que as externalidades, em conjunto, tornam o projeto das PCHs economicamente inviável, socialmente injusto e ambientalmente insustentável, especialmente se comparado com alternativas mais eficientes, como o mix de energias renováveis não-hídricas. “Além de toda perda econômica, as PCHs no Pantanal degradam a qualidade da água, retendo sedimentos essenciais para a fertilização natural do bioma e reduzem a capacidade de sequestro de carbono das áreas alagáveis, são perdas incalculáveis”.

A especialista ainda ressalta que “as PCHs analisadas se beneficiam de uma série de subsídios que distorcem sua viabilidade econômica, como a isenção da compensação financeira pela utilização de recursos hídricos (CFURH), os descontos nas tarifas de uso dos sistemas de transmissão e distribuição (TUST/TUSD) e a contratação compulsória em leilões de energia. Esses incentivos somam R$ 364 milhões, valor superior aos próprios custos operacionais. Na prática, a sociedade está pagando para viabilizar empreendimentos que geram prejuízos à coletividade”, afirma Silvia.
 

O WWF-Brasil recomenda:

  • A imediata exclusão das PCHs previstas para a BAP dos planos de expansão energética;
  • O redirecionamento dos subsídios para fontes realmente sustentáveis e resilientes;
  • O fortalecimento da aplicação da metodologia oficial de Análise de Custo-Benefício (ACB) do governo federal como instrumento obrigatório na tomada de decisões sobre infraestrutura energética.


Sobre o WWF-Brasil

O WWF-Brasil é uma ONG brasileira que há 28 anos atua coletivamente com parceiros da sociedade civil, academia, governos e empresas em todo país para combater a degradação socioambiental e defender a vida das pessoas e da natureza. Estamos conectados numa rede interdependente que busca soluções urgentes para a emergência climática.

Foto | Adriano Gambarini / WWF-Brasil

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