Um dia desses, por causa das minhas necessidades pessoais e profissionais, eu tive de voltar ao passado ao decidir consultar algumas das minhas gramáticas da língua inglesa e confesso que eu fiquei surpreso ao ver a quantidade (e variedade) de volumes que eu tenho no meu acervo – sem contar aquelas que eu tenho no meu computador ou no celular em PDF (portable document format). Algumas delas recebidas como presente ou doação por parte de alunos, amigos e (des)conhecidos ao longo dos vários anos em que eu tenho me dedicado ao estudo e ensino do idioma bretão. Aproveito para agradecê-los publicamente pela deferência. Many thanks!

De todas elas, a mais antiga é a Gramática da Língua Inglêsa (assim mesmo, com acento circunflexo na letra e), de autoria de Frederico Fitzgerald, uma publicação da Livraria Selbach, de Porto Alegre (RS), já na sua vigésima quinta edição. Organizada em 361 páginas, a obra é dividida em duas partes: Pronúncia e Lições Práticas Graduadas, seguidas por seções chamadas Etimologia, Sintaxe, Medidas Diversas e Vocabulário Prático. Datada de 1940, ela logo chama a atenção por causa de três características bastante peculiares: a qualidade do papel utilizado (já castigado pelo tempo), a falta de figuras e cores nas suas páginas (por restrições técnicas, o estilo em vigor na época) e, acima de tudo, a quantidade de palavras e exercícios traduzidos ou para tradução (a tendência educacional naqueles dias). Um assombro!

Não obstante, sinceramente, tirando um ou outro senão aqui e ali, comparada às obras disponíveis no mercado décadas depois, como a Gramática da Língua Inglesa, de Oswaldo Serpa (de 1984), a Gramática Prática da Língua Inglesa – O Inglês Descomplicado, de Nelson Torres (de 1993) e a Gramática Escolar da Língua Inglesa, da Pearson/Longman (de 2005), a Gramática de Frederico Fitzgerald deixa pouco a desejar quando verificamos os tópicos por ela abordados, especialmente aqueles relacionados às tradicionais classes gramaticais (verbos, substantivos e adjetivos, por exemplo), e não faz feio frente à já cult English Grammar In Use, de Raymond Murphy (de 1988), publicada pela Cambridge University Press.

O mais importante, porém, dear reader, é perceber que em todas essas gramáticas mencionadas anteriormente, a língua inglesa está lá praticamente idêntica (na sua ortografia) ao que ela é hoje, o que não se pode dizer da nossa língua portuguesa, que sofreu algumas mudanças desde a distante década de 1940, especialmente no campo da acentuação. Em resumo, se mostrada (e aplicada) aos jovens alunos do Ensino Fundamental e Ensino Médio das escolas públicas e particulares de hoje, a Gramática de Mr. Fitzgerald seria como uma calculadora entre os smartphones e iPhones que a nossa juventude atual tem à disposição, mas ainda assim teria garantida a sua utilidade – mesmo que de forma restrita em algumas das suas seções.

Entretanto, no mundo real, mesmo com a crescente exigência do meio acadêmico e do mercado de trabalho, por exemplo, o que parece não ter mudado muito é o (baixo) entusiasmo e consequente (preocupante) nível de dedicação do alunado quando se trata de estudar (e mormente de praticar e aprender) a lingua franca do momento. Apesar das mudanças ocorridas nas metodologias/abordagens e dos avanços no campo da tecnologia (que inclui os parques gráficos das editoras), os resultados tanto dentro quanto fora da sala de aula ainda estão muito abaixo do desejado ou pretendido. De modo semelhante, apesar do aumento do número de escolas de idiomas em nossa cidade e no país desde os anos 1980, o que mais se vê por aí são pessoas de todas as idades que, mesmo depois de ter terminado este ou aquele English course, ainda têm enorme dificuldade para ouvir, falar, ler e escrever com a almejada fluência na língua de Shakespeare!

Eis uma realidade que, historicamente, tem nos rodeado (e incomodado) desde sempre, remontando ao Descobrimento e contemplando os tempos de escola dos nossos avós e dos nossos pais, quando “saber inglês” significava algo bem diferente daquilo que temos em mente atualmente. Afinal, hoje, passadas algumas boas décadas, ter “noções de inglês” já não é suficiente tanto na vida pessoal quanto profissional do cidadão que quer ter um bom nível de educação e um bom emprego. Por isso, convenhamos que talvez já tenha passado da hora de mudar esse estado de coisas, essa vergonha nacional. Resta saber apenas quem está realmente disposto a entrar nessa peleja…

Jerry T. Mill -Mestre em Estudos de Linguagem (UFMT), presidente da Associação Livre de Cultura Anglo-Americana (ALCAA), membro-fundador da ARL (Academia Rondonopolitana de Letras), associado honorário do Rotary Club de Rondonópolis e autor do livro Inglês de Fachada

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