Dois anos após procedimento, Raquel Guimarães havia emagrecido 70 kg, mas a um alto custo: ela perdeu o movimento das pernas

A cirurgia bariátrica pela qual a estudante Raquel Guimarães passou cumpriu o seu propósito inicial: apenas dois anos depois do procedimento, ela já havia perdido mais de 70 kg. Mas o custo disso foi alto: ela perdeu os movimentos das pernas, em função do quadro de desnutrição grave e a deficiência das vitaminas B1 e B12.

Mas Raquel virou o jogo e, cinco anos de muita perseverança depois, ela voltou a caminhar sozinha: “Foi o momento mais feliz da minha vida”, contou a jovem nas redes sociais.

O procedimento a que Raquel foi submetida é conhecido como bypass gástrico, o tipo de cirurgia bariátrica mais comum no Brasil e que provoca uma grande alteração no sistema digestivo, com a redução do estômago e efeitos sobre os intestinos.

Com problemas para se alimentar no pós-operatório, Raquel acabou desenvolvendo a chamada encefalopatia de Wernicke, provocada pela deficiência grave de vitaminas do complexo B, caso considerado raro pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM). No Brasil, foram realizadas em 2018 cerca de 65 mil cirurgias bariátricas, segundo a SBCBM — e mais de 13 milhões de brasileiros são considerados “elegíveis” para o procedimento. O índice de mortalidade, segundo Vilas Bôas, é de cerca de 0,2% dos casos.

Foram justamente as probabilidades positivas que levaram Raquel a escolher o procedimento. Segundo a jovem, haviam casos bem-sucedidos na vizinhança e, inclusive, na família.

Além do cenário positivo, Raquel já não conseguia manter uma rotina saudável e sociável. Ela pagava personal (trainer), ia a academia, ia para o endocrinologista. Mas, quando começava a emagrecer, sentia problemas no tornozelo e precisava imobilizar. “Sem ir à academia, engordava tudo de novo. Poxa, uma jovem de 20 anos, se esforçava tanto, mas o resultado não vinha”, contou Raquel em entrevista para a BBC Brasil.

Com a decisão tomada, a família de Raquel conseguiu os R$ 22 mil necessários para o procedimento particular. Em setembro de 2014, a cirurgia foi feita, sem complicações iniciais. Mas tudo mudou dois meses depois.

Em dezembro do mesmo ano, Raquel estava em casa, em pé, quando desabou, sem força nas pernas. Levada ao hospital, foi identificada a falta de vitaminas, segundo a família. A jovem foi internada no CTI para repor os nutrientes, mas recebeu um diagnóstico que assustou: já não voltaria a andar.

A estudante chegou a pesar menos de 40 kg e passou meses internada no hospital sobrevivendo graças a transfusões de sangue e alimentação por sonda.

Raquel durante internação
Hypeness

Em 2019, cinco anos após o procedimento em um hospital particular na zona oeste do Rio de Janeiro, a jovem voltou a dar os primeiros passos sozinha – tudo graças a teimosia de sua família que, contrariando todas as probabilidades, insistiram nas visitas médicas até que encontraram um exame chamado enterografia e mostrou que Raquel havia tido uma resposta de estenose exacerbada — quando ocorre um estreitamento do trato digestivo no momento da cicatrização interna da cirurgia, uma espécie de “queloide interna”. No caso da jovem, o problema estava no intestino delgado e isso impedia a passagem de alimentos.

A partir do diagnóstico, os procedimentos simples de dilatação da região resolveram o problema. Para Raquel, o procedimento foi o início de uma nova fase. Ela voltou a se alimentar pela boca, tomar água e, finalmente, iniciou a recuperação. Ganhou peso e voltou a sentir as pernas. “Eu achava que não ia conseguir, estava exausta. Pensava: ‘não vou andar mesmo, não adianta nem fazer fisioterapia’. A virada foi quando comecei a sentir as pernas. Eu pensei: ‘espera aí, tem chance sim de eu começar a voltar a andar’”, conta.

De clínicos e nutricionistas, a jovem passou a frequentar consultórios de ortopedistas. Até que, em setembro de 2017, passou por um procedimento cirúrgico para colocar um fixador externo na perna direita. Um ano depois, foi a vez da perna esquerda. A fisioterapia virou rotina em casa.

Nas redes sociais, Raquel hoje mostra, além de sua recuperação, aquilo que muitos jovens que se submetem ao tipo de procedimento costumam fazer: o “antes e depois”. Não só da perda de peso, mas também o antes e depois de “dar ruim”, como ela mesma se refere às complicações.

Antes e depois de Raquel
Hypeness

Aos 25 anos, com 1,72 metro e 58 kg, Raquel prepara um livro de memórias, com o título Caminhando nas Estrelas. Nele, vai relatar o momento do qual poucos podem se lembrar: qual é a sensação de aprender a andar? “Um passo de cada vez e a gente chega lá.”

Fonte | BBC

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