Um dos golpes era a repatriação de valores de corretagem de uma suposta mina de ouro, que prometia a cada R$ 1 mil investido o retorno de pelo menos R$ 1 milhão.

Cerca de 25 mil pessoas em todo o país e um prejuízo ainda não calculado, mas que deve passar de milhões de reais. Essa é a estimativa do dano que um grupo suspeito de crimes contra o mercado financeiro e formação de quadrilha preso nesta terça-feira (21) na operação Ouro de Ofir da Polícia Federação e Receita Federal causou.

Segundo o delegado regional de Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal em Mato Grosso do Sul, Cléo Mazzotti, um dos golpes aplicados pelo grupo consistia em prometer a investidores um retorno milionário com a repatriação de uma corretagem da venda de ouro de uma fictícia mina de ouro na Bahia.

“Na história que eles contavam, essa mina teria sido explorada na época do Império. O ouro teria sido vendido para a Europa e os Estados Unidos. Uma família de Campo Grande, que seria a dona da mina, teria após mais de 60 anos de tramitação de um processo em uma suposta corte internacional, ganhado a ação, que em valores corrigidos, seria, conforma quadrilha de US$ 2,7 trilhões. Um valor fora da realidade. Desse valor, a família ficaria com 60% e 40%, conforme determinado pela suposta corte teria de ser doado. Os golpistas prometiam as vítimas um retorno milionário, desde que elas ajudassem a pagar os custos para trazer esse dinheiro. O investimento mínimo era de R$ 1 mil e o retorno prometido seria de pelo menos R$ 1 milhão. Assim teve gente que investiu R$ 1 mil, teve que gente que investiu R$ 5 mil, outros R$ 30 mil”, explica o delegado.

Outro golpe, de acordo com Mazzotti, prometia quantias também milionárias com a liberação de uma antiga Letra do Tesouro Nacional (LTN), mas também mediante pagamento prévio.

Relógios apreendidos na operação Ouro de Ofir, em Campo Grande, MS (Foto: PF/Divulgação)

Relógios apreendidos na operação Ouro de Ofir, em Campo Grande, MS (Foto: PF/Divulgação)

O delegado acredita que há pelo menos dez anos os suspeitos vinham aplicando esse tipo de golpe, mas que nos últimos dois a metodologia foi aprimorada. Ele explica que o grupo tinha quatro divisões: os líderes, chamados de paymasters; os escriturários, que ficavam encarregados de recrutares os corretores, e estes, que por sua vez procuravam as vítimas, em redes sociais, grupos de wattsapp e até em em igrejas. “São centenas de corretores em todo o país. Nos acreditamos que alguns sabiam que era um golpe, outros não. Isso vamos verificar em uma outra fase da investigação”.

De acordo com Mazzotti, nesta etapa da investigação, que já dura pelo menos seis meses, o trabalho foi centrado nos líderes da quadrilha, os três paymasters, que foram presos com mandados de prisão temporária em Campo Grande. Na ação, deflagrada nesta terça-feira foram apreendidos mais de R$ 1 milhão em dinheiro, carros de luxo, 200 quilos de pedras preciosas e armas de fogo.

Além de Campo Grande foram cumpridos mandados de busca e apreensão também em Goiás e no Distrito Federal. Um pessoas está foragida e quatro foram levadas com condução coercitiva para prestarem depoimento.

PF e Receita desarticulam esquema com promessa de ganho fácil com investimentos

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Fachada

O delegado disse que para dar uma fachada de credibilidade ao golpe a quadrilha utilizava vários artifícios. Um dos membros, por exemplo, apresentava uma carteira de juiz federal arbitral e o outro se identificava como cônsul de Guiné Bissau. “Não existe essa função de juiz federal arbitral. O juiz arbitral é função particular, que atua em conciliações. E o membro do grupo se apresentava somente como juiz federal. A mesma coisa é com o que se apresentava como cônsul, que é uma função honorária. Eles usavam isso para dar status, dar mais credibilidade ao golpe”.

Um dos presos na operação Ofir, em Campo Grande, MS (Foto: Alexandre Cabral/ TV Morena)

Um dos presos na operação Ofir, em Campo Grande, MS (Foto: Alexandre Cabral/ TV Morena)

Outra ferramenta utilizada pela quadrilha, de acordo com ele, era o da falsificação de documentos públicos, de instituições como o Banco Central e o Banco do Brasil, para aumentar a confiabilidade das vítimas. “Chegavam a ponto de publicarem fotos em redes sociais, na entrada do Banco Central dizendo que estavam saindo do local, após reuniões para tratarem de assuntos relativos a liberação dos recursos para pagarem os investidores. Só que nunca pagavam. Quando chegava a data combinada sempre ocorrida um problema. Na investigação não detectamos nenhuma vítima que tenha recebido nada do esquema”, diz.

Além disso criavam documentos com nomes complicados, como contrato particular de participação ad-exitum, que eram, inclusive, registrados em cartórios. “Os cartórios não tinham nenhuma participação. Tanto que em todos os documentos, publicavam que não tinham nenhuma responsabilidade sobre o que estava sendo assinado”, comenta Mazzotti.

O delegado acredita que o patrocínio da empresa de um dos presos ao Campeonato Estadual de Futebol deste ano e ao Operário Futebol Clube, possa ter sido usado pelo grupo para reforçar a confiança dos investidores nas promessas de ganhos milionários e também para lavar dinheiro.

Em nota a Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul (FFMS) diz que não tem nada a declarar neste momento, e que vai aguardar o fim das investigações para se pronunciar, mas reforço que tem contrato com a empresa até o fim deste ano. Já o Operário, que tinha patrocínio da empresa do suspeito no estadual deste ano, disse que precisou rescindir o contrato por falta de pagamento e que o clube processa a companhia por conta disso.

O delegado adjunto da Receita Federal em Mato Grosso do Sul, Henry Tamashiro de Oliveira, explicou nesta manhã que técnicos do órgão fizeram um mapeamento das declarações de Imposto de Renda dos suspeitos de comandarem o grupo e notaram que nos últimos anos houve um crescimento anormal dos valores declarados.

“Entre 2012 e 2013, eles declararam valores muito baixos e nos últimos anos, esse valor foram aumento, com declarações de direitos e valores expressivos, que passavam de milhões de reais”, explica, completando que essas declarações também era usadas pelo grupo para mostrar que havia lastro para os ganhos financeiros que elas ofereciam com os golpes.

Dinheiro apreendido em um dos endereços da operação Ofir, em Campo Grande, MS (Foto: PF/Divulgação)

Dinheiro apreendido em um dos endereços da operação Ofir, em Campo Grande, MS (Foto: PF/Divulgação)

Outro fato, conforme o delegado regional de Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal que chamou a atenção durante a investigação foi o uso aprimorado de técnicas de neurolinguista pelos golpistas contra as vítimas. “Eles convenciam as pessoas, mesmo com histórias absurdas que o ganho que elas poderiam ter era real, e as vítimas acreditavam. As vezes pressionavam as vítimas para que elas investissem mais, dizendo que as cotas estavam acabando e como recompensa ofereciam possibilidade de ganhos ainda maiores. Por isso, que a recomendação que fazemos é que sempre antes de investir, que as pessoas procurem se informar e desconfiem sempre de ganhos muito grandes com investimento baixo”, alerta.

Inicialmente, Mazzotti explica que os suspeitos presos vão responder por crimes contra o mercado financeiro nacional e por organização criminosa, mas que dependendo da atuação de cada um deles no grupo poderão ser indiciados também por estelionato, falsificação de documento público e falsidade ideológica.

Nome da operação

Segundo a PF, Ouro de Ofir é baseado em uma cidade mitológica da qual seria proveniente um ouro de maior qualidade e beleza. Tal cidade nunca foi localizada e nem o metal precioso dela oriundo.

Fonte | Globo.com

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